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sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Nossa matriarca Maria

Sempre senti as orações de vozinha cruzando as fronteiras e afagando meu coração em momentos difíceis. Quando vou até lá, observo com admiração seus rituais, a vela, a bíblia, a foto de um filho, neto, bisneto ou tataraneto. É uma escolha iluminada o personagem ou os personagens de cada dia. Nos últimos dias, em que ela não está conseguindo fazer suas rezas por conta do declínio da fraqueza e das dores que está sentindo...99 anos ... e nunca havia ficado acamada ...tenho eu rezado o Terço por ela aqui em casa, rogando intercessão por minha avó, nesse seu momento de fragilidade, que ainda assim, retrata sua fortaleza de seguir respirando e de me responder, ainda que de olhos fechados, na chamada de vídeo: Deus te Abençoe.

Muita gente pensa que o nome de minha avó é Joana. Todos a chamam de Joaninha. Um apelido carinhoso e ela é Sim tão linda quanto as graciosas joanas que voam pelos jardins do mundo. Seu nome é Maria, seu sobrenome é Neto e no meio tem o composto Anunciação. Ela veio mesmo para anunciar ao mundo uma força que inspira os passos dos Netos de sua geração. Filha de Aurora e Manoel Neto, meus bisavós, que tive a honra de conhecer. Uma Senhora Fortaleza de 99 anos e 6 meses, tataravó dos filhos da sua primeira bisneta, netos da sua primeira neta, eu também Maria.

Em maio deste ano, presenciei sua alegria ao conhecer seus tataranetos Peaches e Damian, rever sua bisneta Bruna e sua fala me agradecendo por cumprir essa missão seguirá ecoando em meu espírito. Sou muito grata pela vida da Maria da Anunciação Neto, pela multiplicação do amor que ela plantou em nossa família e nos amigos, pelo legado de bondade e oração que ela cultivou em todos os seus dias. Sua lucidez é encantadora. Sua história é pontuada pelos desafios que permeiam a vida de tantos sertanejos. Tão acolhedora, generosa e sensata, seus ensinamentos permanecerão entre nós. Ela que tem uma memória admirável continuará em nossas memórias como exemplo de fé, devoção e amor.

Todas as vezes que eu chego no sertão, abro a porteira e contemplo o alpendre, sinto tanta paz com o acolhimento da casa que me abraça e recebe com afeto. A luz matinal reflete nas paredes, o sorriso de vozinho ecoa no horizonte e os sons familiares do fogão a lenha, das vozes, dos pássaros e do canto da roça enternecem minha audição. Como uma canção de ninar que embala o sono. Continuarei sentindo sua presença e pedindo sua Benção, enquanto o som dos ventos tocarem meus sentidos. Que eu tenha a graça de viver um tempo fértil para seguir cultivando o que sei e sinto de tua história.Que assim seja. Amém!

Vida abençoada pela Fé
Oração que protege
Zelo admirável pela família
Iluminação da casa
Nutrição ancestral
Honra e legado sagrado
Amor multiplicado

segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Roda do oráculo do samba

Estamos em 2024, há 35 anos estou em Osasco e foi nessa cidade que conheci o samba, em um churrasco, em uma das casas de aluguel que nossa família morou. O ritmo contagiou minha alma e desde então sigo apaixonada. Em 2023, resolvi fazer uma roda de samba com os amigos pais, um presente do Dia dos Pais. Foi sensacional. Em 2024 repetimos a dose neste último sábado 10/08/24. Vamos fazer do encontro uma tradição que nos enlaça.

O repertório rico em canções da “velha guarda”, do ontem, do hoje e de sempre, do samba e pagode. Martinho, Zeca, Fundo de Quintal, Raça Negra, Arlindo Cruz, Jorge Aragão, Xande, a madrinha Beth Carvalho e tantos outros que marcam nossas vidas. Paulinho da Viola, Cartola, Clara Nunes, Noel Rosa, Pixinguinha, Dona Ivone Lara, salve os mestres atemporais que seguem vivos na memória musical.

Dizem que o samba pede passagem, nessa casa que sou, ele tem janelas e portas abertas para chegar e me curar com a alegria que gira em meus poros. E que bênção ter nessa roda os amigos que dançam, cantam até perder a voz e fazem desse momento um marco de nossas histórias. Um deles é especial, o carioca Renato que nos encanta com a felicidade rara que ele emana. Que conexão mágica do nosso amigo que chamamos de “oráculo do samba.”

Gratidão universo por mais uma roda de samba e uma rodada de cura. Até 2025.
Gratidão Celinho e Renato. Viva o Samba!

“Canta canta, minha gente
Deixa a tristeza pra lá
Canta forte, canta alto
Que a vida vai melhorar...”

terça-feira, 23 de julho de 2024

Homenagem bisavô

Minha prima Pérpetua, que mora em Petrolina, veio passar uns dias de férias em São Paulo e visitou o renomado restaurante de comida sertaneja na Vila Medeiros. E que surpresa emocionante ela encontrou no Restaurante Mocotó do Rodrigo. Uma foto do seu Tio Manoel Neto, que também é meu bisavô, pai da minha Vozinha que tem 99 anos. Tive o privilégio de conhecer meu bisavô e bisavó Aurora.

A mesma foto desse sertanejo, que carrego o sobrenome, está enfeitando também um Museu em Recife e outros cenários que homenageiam os vaqueiros de Serrita. Meu vô do Ingá, como eu o chamava, não perdia nenhuma missa dos vaqueiros, era personagem simples e ilustre desse evento importante do calendário regional de Pernambuco.

Ah e Ingá é uma referência ao nome do sítio que ele morava e que ainda hoje é morada de muitos Netos. Quando menina, eu saia de Araripina, onde meus pais moravam, e ia passar férias na roça, na casa dos meus avós, que ficava perto da casa dos meus bisavós. Eu os encontrava no alpendre da casa. Quantas memórias afetivas afloradas com essa imagem.

Se eu já tinha vontade de conhecer o Mocotó, agora sim já está na minha lista de prioridades. Vou lá provar das delícias culinárias e ver de perto a foto do meu bisavô. Gratidão ao Sr. Manoel Neto que deixou um legado que segue vivo entre os seus descendentes. Muito obrigada ao Rodrigo por essa homenagem. Os retratos dos personagens do Sertão atravessam fronteiras. Minha gente, o Sertão é o Mundo!


Essa é a foto de Manoel Neto ilustrando a parede do Restaurante Mocotó


Essa foto é do casal Neto, Manoel e Aurora, que enfeita a parede da sala de vozinha, sua filha que segue firme aos 99 anos. A tataravó dos meus netos. Que bênção!

quarta-feira, 26 de junho de 2024

Encontro ancestral

Quais memórias levamos de uma viagem? Quanta bagagem afetiva vem em nossa mala coração? Nesses poucos dias no sertão nos conectamos de forma mágica com os nossos cenários e família. Amor cultivado que segue reverberando nas lembranças e entranhados em nossa pele saudade.

Dos princípios que pratico, a valorização das minhas raízes e dos meus ancestrais, é um deles. Sempre procuro ensinar para meus filhos e, agora, também aos netos, a importância de valorizar as histórias e pessoas que amamos e reconhecer que somos parte de uma trança de gente. Apesar de ser de uma família onde em parte dela habita o silêncio, tenho a honra de conhecer nuances da vida dos meus bisavós, avós e pais.

Depois de 8 anos longe, minha filha retornou ao Brasil para nos visitar. Desde que ela programou a viagem, o primeiro pedido dela foi levar seus filhos para conhecer a tataravó. Nasci no sertão de Pernambuco, minha primogênita em Osasco São Paulo e meus netos nasceram nos Estados Unidos. Minha avó tem 99 anos, bisavó da Bruna e tataravó de Peaches e Damian. Indizível a imensidão de sua alegria ao conhecer os tataranetos. Cenas ímpares que ficarão gravadas em meu livro coração. Que encontro presente!

Foram 2 meses intensos deles aqui e a presença deles segue palpitando...no pincel colorido da Peaches, nos carrinhos do Damian, no cheiro da roupa da Bruna - que eu não vou lavar - no caderno que ela me presenteou que estou escrevendo minhas orações...nossa proximidade é sagrada e sempre será. O amor é a nossa força filha... é essa potência que nos encoraja a vencer as adversidades. Lembra dos cactos e do beija flor vozinho na chegada e também da tríade deles na despedida. Sinais dos laços que nos unem.

Das tantas emoções da viagem ao nosso sertão, Peaches rezando no túmulo de vozinho em nossa companhia, a oração do Santo Anjo que ele me ensinou, que eu ensinei para meus filhos e para os netos, foi sensacional. E por falar nele, que vive em nossos passos, o melhor homem que eu conheci na vida, eu escrevo a frase que ele te disse, da última vez que você esteve com ele: “segue seu coração e seja feliz”

Nas veredas do sertão, os passos das gerações. Gratidão Deus!

domingo, 28 de janeiro de 2024

Sertão 2024

Cheguei em São Paulo quando eu tinha 14 anos. Lembro até hoje do frio que senti e do espanto com o céu todo branco acinzentado. Demorei muito para visitar Pernambuco por falta de recursos. Meu avô paterno faleceu e até hoje recordo da dor rasgando meu peito com a notícia. Somente nos últimos 12 anos eu tenho conseguido ir com maior frequência e por conta do trabalho sempre vou, nas palavras de minha avó: “ligeira como relâmpago.” Dessa vez foi diferente, consegui ficar duas semanas.

Primeiro fui para Araripina, terra onde nasci. Na casa de meu pai que reside em Lagoa do Barro, palco de minha infância. Eu morei também em Trindade e alguns meses em Recife, mas foi nesse distrito que cresci e morei mais tempo. A igreja, a escola, a praça, as ruas, as roças, o açude, o riso, as delícias na mesa, os abraços e as memórias. Visitei minhas tias, primos e primas, e nem deu para ver todos, eita família grande.

De lá segui para Parnamirim e Serrita, terra da minha família materna. Minha vozinha está prestes a completar 99 anos. Que bênção escutar suas histórias, presenciar sua reza e seu amor exalando no respirar do seu cotidiano. A paz de sentar-se ao seu lado, observar sua oração fervorosa, ouvir sua voz e sentir seu cheiro. Trouxe na bagagem a força de sua presença.

Dessa vez tive a coragem de visitar o túmulo do meu Vozinho. O cemitério na caatinga, com a capela ao lado e a árvore na frente, com sombra generosa. Ao lado da sua cruz, coloquei flores amarelas que colhi fresca, acendi três velas e joguei a água benta que a vozinha pediu. Uma borboleta amarela bailava enquanto eu ia respingando a água sobre o chão do sertão. Ele está em Paz e segue iluminando meus passos com sua ternura.

Cactos, mandacaru, xique-xique, palma e as tantas plantas e árvores da caatinga descritas pelo meu tio Neto durante a trilha nas veredas. Que sertanejo! Os pássaros, os ninhos, as pedras pequenas, médias e grandes, a areia da estrada, os bichos, o açude, a serra e o cenário da terra dos meus ancestrais revelando a riqueza desse bioma ímpar.

O fogão a lenha, o cuscuz com feijão verde, a carne de bode torrada e assada na brasa, o baião de dois com nata, o bolo de caco, de milho, liso e fofo. A rapadura, os sucos naturais da tia, o umbu, o doce de leite, o chá noturno de erva doce com cana, a sopa, o pirão do tio Chico, a cajuína e a variedade de chás que eu trouxe da farmácia da feira. E ainda encontrei o rosário de catolé com coquinhos deliciosos.

Quanta partilha na viagem de férias pelo sertão. Quantas memórias cultivadas nas prosas do alpendre e cozinha. A luminosidade do amanhecer, o encantamento do entardecer e as estrelas cintilantes na noite de Lua Nova e Crescente. Dois ciclos lunares, duas semanas e muita vida. Na estrada da saudade eu sigo. Amo o lugar que moro. Nessa região metropolitana paulista que vivo carrego a fortaleza de Ser Sertão.

Igreja de São João Batista - Lagoa do Barro, Araripina PE

mãos que partilham histórias. Minha vozinha e eu

a flor do mandacaru enfeitando a vereda

no sítio Tigre, a Capela de Santa Terezinha

Fortaleza do Sertão

um dos símbolos da casa de vozinha

sábado, 23 de dezembro de 2023

Rio de Afeto

Qual o significado de Rio de Afeto? Enviaram essa pergunta no comentário de uma foto que publiquei quando viajei para o Rio na companhia do meu caçula. A resposta está no retrato de amor exalado para além da imagem. Tem sensações que jamais conseguiremos explicar, apenas sentir, dessas coisas indizíveis carregadas de profundidade e que marcam nossas vidas.

Viajamos em setembro, na chegada da primavera com onda de calor. O Rio nos recebeu mais uma vez com abraços fraternos, encontros alegres, diálogos nutritivos, riso e o afeto de estar juntos com gente de sintonia elevada. Dos presentes cariocas que levo para todos os caminhos que eu cruzar. Dani, Tassa e Maria, adoramos estar e sentir a presença de vocês em 2023. Retornar ao RJ já está no horizonte das viagens de 2024. Um xero e feliz Natal.

Sou muito grata pelos laços que vou tecendo na minha estrada de saudades.

Sintonia refinada de amor: tia Dani e Arthur

Admirável Tia Tassa, te amamos

os primos, Maria e Arthur, ouh lindezas.

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Entarceder saudade

Desde pequena tenho encanto pelo entardecer. A despedida do dia, as sombras do cair da noite, aquela sensação de saudade do que foi e uma esperança do que virá na próxima alvorada. Os sinos tocavam na hora da Ave Maria, o silêncio noturno da oração e o convite ao recolhimento do sono e sonhos. Eu espiava demoradamente o céu estrelado do sertão para escolher a estrela sorriso mais brilhante e rezava. Dessas imaginações de menina ou, como alguns dizem, dessas loucuras que tive e tenho.

O “arrebol” cantado, contemplado e até os que se escondem em dias cinzas aqui em São Paulo, é um chamado para uma pausa. Hoje acordei recordando dias em que tive o privilégio de contemplar o entardecer no mar, um canto sagrado. Sentada com os pés na areia, ouvindo o canto das ondas e as cores alaranjadas tingindo o oceano. Um dos momentos de conexão que traz uma leveza que flutua pelos sentidos, sempre.

As paisagens que atravessam anos com a beleza da lembrança sensorial trazem esse aroma do presente. É como uma malha do tempo que segue viva, ainda que ganhe novos significados, já que somos transformados a cada estação. A menina do sertão, onde o poente, pela localização geográfica costuma acontecer na mesma hora, continua vislumbrada pelo pôr do sol nos lugares onde estiver e nos que estarão no horizonte.

E qual a magia do crepúsculo? Tenho a sorte de conhecer muitos laços que apreciam o entardecer e sou presenteada muitos dias com fotos de cidades, do sertão e do mar: “lembrei de você ao olhar o céu” ou “essa paisagem é sua cara” ou ainda “você está aqui comigo.” É mesmo refinado aquilo que nos conecta, afinal, numa imagem reside a luminosidade do Sol afeto, esse que é capaz de tornar mágico nossos dias. Essa é a magia do sentir.

Gratidão por tantos “arrebóis” em Ubatuba, São Sebastião, Guarujá, Rio de Janeiro, Plymouth, sertão de Pernambuco, Osasco, Cotia e outras cidades. Estou sempre acompanhada no ocaso. Que eu tenha a dádiva de seguir tatuando o entardecer em meu livro-coração.

São Sebastião - dezembro 2022
casa - setembro 2023
Minha neta, no pôr do sol do Hemisfério Norte
Sertão de Pernambuco, casa dos meus avós.

Nossa matriarca Maria

Sempre senti as orações de vozinha cruzando as fronteiras e afagando meu coração em momentos difíceis. Quando vou até lá, observo com admira...