Minha estimada vozinha, saudades de sua presença firme.
Sim, mesmo diante da fragilidade do seu corpo pela idade avançada, reside na
Senhora uma Fortaleza que me inspira. Já disse várias vezes e nunca me cansarei
de dizer o quanto me sinto honrada em ser sua neta, em fazer parte de tua
linhagem e carregar em meu DNA e sentidos a grandeza do seu sangue e amor. Fecho
meus olhos e lembro da minha vozinha em sua casa, assistindo suas orações, sentada
no canto da janela da cozinha, no alpendre, no terreiro e deitada em sua cama. O
seu apreço pelo seu canto é marcante.
Eu que sempre gostei tanto de rua, até nas minhas andanças hoje vejo que
carregamos conosco a nossa casa na casa que somos. E isso aprendi com o tempo e
espero que ter uns anos para seguir desenhando a casa que sou. Uma certeza que
tenho é que nessa morada há muito das minhas avós. É uma maneira viva de
carregar o sertão comigo onde quer que eu vá, na presença das rezas, nas lembranças
dos cantos das novenas, nas paisagens que circundam meus sonhos e em todas
essas memórias dos afetos dos meus que seguem palpitando em meus poros.
Ser forte é também ter a coragem de reconhecer nossas fraquezas e as vezes eu
esmoreço sim vozinha. Nessas horas de agonia, eu me apego na contemplação do
entardecer ou no canto da alvorada, eu rezo o Santo anjo e a Ave Maria, revivo os
mergulhos no açude contemplando os raios do Sol, sento a beira da água para
ouvir de novo as marés encantadas, ouço os vagalumes brincando com as estrelas
do céu e sinto o crepitar das fogueiras. E sinto que há uma mágica dos sentidos
que floresce meu ânimo.
Eu te vejo vozinha como o anjo protetor de nossa família. Sei
que já sofreu muito e conseguiu continuar na peleja. Não há família perfeita e
temos nossos desafios que dói. Temos nossas passagens doloridas e vamos colecionando
essas cicatrizes, que também chamo de cruzes, como essas que são fixadas nas
estradas do sertão marcando a morte de alguém. Penso que morremos e renascemos
várias vezes nesse percurso. E lembro do mandacaru e xique xique que renascem
com as chuvas e tantas outras vegetações desse sertão que nos brinda com esse
milagre das águas. É quando sinto emergir essa força que parece surgir das
entranhas. Só quem nasce nessas terras conhece essa energia.
Vozinho me dizia da sua braveza e eu lembro de suas brigas
e da forma como o amor estava na entonação brava de sua fala. Eu tento ensinar
isso quando brigo com o Arthur, o caçula danado. Quem ama corrige. E sei que todas
suas brigas foi e continua sendo pensando no bem de todos nós. Não sei se Peaches
e Damian, meus netos e seus tataranetos terão a honra de conhecê-la, espero que
sim. Assim como anseio contar a eles a sorte de ter uma Tataravó Maria tão
preciosa. Nesse tempo que habitamos é um tesouro ter uma família que é retrato
de acolhimento e ter uma avó que é referência de Amor. Sempre me senti acolhida
em tua casa coração. É na minha casa coração que minha vozinha fará morada
eterna.
Da Maria Ivone, a neta.
Cotia – SP, 28 de agosto de 2021
Escrevi do meu quarto, sentindo o cheiro e o canto da chuva, é manhã de
inverno. Sábado. Lua Minguante.
Memórias da minha trança de gente, do que palpita em meu livro-coração, da proximidade sagrada que me conecta aos personagens da Estrada que sou
sábado, 28 de agosto de 2021
Carta para Maria avó
Vozinha no alpendre de sua casa no sítio, em noite de Lua Cheia
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100 anos de memórias
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